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MÃE CACILDA DE ASSIS O Reinado de Seu 7 da Lira

Foto do escritor: Luiz de MirandaLuiz de Miranda
Mãe Cacilda, incorporada com Seu 7 da Lira numa Sessão de Trabalho

Nascida em Valença (RJ), no dia 15 de março de 1917, Cacilda de Assis viria a ser uma das Yalorixás mais famosas da Umbanda no Brasil.                                                                                                                                                                     Aos 7 anos de idade, Cacilda de Assis teve a primeira manifestação de sua mediunidade, quando em seu aniversário sofreu um desmaio e entrou em coma. Orientados por parentes para levá-la a uma benzedeira, seus pais repudiaram tal sugestão. Mas, depois de muita insistência e vendo que a menina não reagia aos impulsos, resolveram liberar a presença da benzedeira, que de imediato percebeu tratar-se de uma possessão espiritual. Foi então, que resolveram encaminhar a menina para a Federação Espírita Brasileira, a fim de iniciar seu desenvolvimento mediúnico.

                Mas, é no Terreiro de Pai Benedito do Congo, em Valença, que aos 15 anos de idade, a jovem Cacilda de Assis faz sua camarinha (ritual de recolhimento para se preparar um médium de Umbanda),para Xangô e Iansã, de quem era filha, e em seguida segue fazendo os Assentamentos de suas Entidades, que entre elas, está aquele que lhe daria fama e prestígio por décadas: Exu 7 da Lira. Tal era sua dedicação e força espiritual, que Cacilda, agora Mãe Cacilda, assume a liderança do Terreiro, onde permanece até a década de 50, quando então sua Pombagira Dona Audara Maria, entrega nas mãos do filho carnal de Dona Cacilda o número da loteria, que deveria ser apostado de imediato, e o dinheiro ganho teria a finalidade de comprar um terreno e construir seu próprio Terreiro. O número dá inteiro no primeiro prêmio da Loteria Federal.

Mãe Cacilda incorporada com Pombagira
Pombagira Audara Maria

                Em 1958, é inaugurada a Tenda Espírita Filhos da Cabocla Jurema, no subúrbio do Rio de Janeiro, no bairro de Cavalcanti.

                Em pouco tempo o espaço da Tenda se tornou pequeno demais para suportar o grande número de pessoas que ia em busca das curas do Exu 7 da Lira. Era urgente a necessidade de um espaço maior.

                O Terreiro então passa para o bairro Santíssimo, lugar muito distante da cidade e de pouquíssimos moradores. Mas, bastou a chegada de Mãe Cacilda e de Seu 7 da Lira, para acontecer as grandes mudanças, trazendo uma nova realidade para o até então, esquecido bairro de Santíssimo. Tudo prosperou absurdamente.

                Atabaques, cavaquinhos, pandeiros, chocalhos e tantos outros instrumentos formavam sua banda. Sim, Seu 7 da Lira iniciava seus atendimentos diariamente sob canções de todos os estilos, desde seus pontos cantados, sambas, marchas de carnaval, choro, bolero, valsas, até Niccoló Paganini o violinista italiano do século XIX e Ave Maria de Gonoud. Era um verdadeiro show de fé e grandes curas. A multidão ordeira aguardava a chegada do Exu, vaidoso, apresentava-se sempre muito bem vestido, ostentando roupas muito bem bordadas em lantejoulas e paetês, com sua capa que pesava em torno de sete quilos. Saudava a multidão de aproximadamente 20 mil pessoas, jogando sua bebida, a marafo, sobre todos os presentes. O Terreiro era frequentado por jornalistas, artistas, comerciantes, médicos, políticos, jogadores de futebol, pobres, ricos...

                Sua fama de milagreiro espalha-se pela cidade e pelo país, fazendo de Mãe Cacilda, a primeira pessoa a aparecer na capa da Revista Cruzeiro, muito famosa na época, com as vestimentas de Seu 7 da Lira. Em seguida é convidada pela poderosa gravadora ODEON, para gravar um LP com os pontos cantados no seu Terreiro. Com isso, ganha um programa na Rádio Metropolitana do Rio de Janeiro, onde começa a difundir os ensinamentos sobre a Umbanda. No carnaval de 1971, forma o Bloco da Lira, comandado pela presença do próprio Exu devidamente paramentado, que inclusive ganha o prêmio de destaque no carnaval e fica em terceiro lugar com o samba composto pela Yalorixá, Podes Voltar; ficando à frente do Cordão da Bola Preta, que ficou em quarto lugar. Um adesivo para carros feito com seu nome e cores, vira uma febre na cidade.


Seu 7 da Lira incorporado em Mãe Cacilda

 O Reinado de Seu 7 da Lira                                                                                                                 

Era o apogeu daquele que mais tarde experimentaria a ira da ditadura militar, ataques da CNBB, sendo inclusive considerado um mal para Umbanda, pela União Brasileira de Estudos e Preservação dos Cultos Africanos, na pessoa do seu presidente Manoel Queiroga.

                O apresentador Flávio Cavalcanti, tem um programa na TV Tupi, que disputava audiência com Chacrinha, na TV Globo. Flávio então se adianta, e marca com Seu 7 da Lira, sua ida ao seu programa no dia 29/08/1971, o que contraria Mae Cacilda que de tudo faz para cancelar essa visita. No entanto, Seu 7 da Lira diz que tem a missão de levar luz e amor para todos, e que o programa de televisão é um excelente meio para esse fim.

               

                “Chegando no local, o EXÚ SETE DA LIRA não se fez de rogado e com sua capa preta, cachaça na mão e charuto adentra triunfante nos estúdios sem dar tempo de nenhuma apresentação. Seus filhos de santo vão atrás levando atabaques e o programa vira uma catarse, pessoas que possuíam alguma mediunidade presentes no local, começam a passar mal, a linha telefônica do país congestionou e em frente as câmeras ele passa a sua mensagem de amor e paz. No mesmo momento, a produção do Programa do Chacrinha liga para as pessoas mais próximas criticando a preferência, pois naquele momento o programa de Flávio batia todos os recordes de audiência da televisão da época. Seu sete não pensa duas vezes e manda responder que também passaria lá para dar um abraço no outro apresentador e assim o fez. Em 20 minutos, o Exú já estava adentrando os estúdios da TV GLOBO, no Jardim Botânico, e também entra triunfantemente no palco. E a história se repete, várias chacretes passam mal, pessoas no palco também incorporam e ele vai direto abraçar Chacrinha e lhe dar um recado no pé do ouvido: “ … – Fique firme seu filho não irá morrer, mas viverá numa cadeira de rodas para sempre …”. O filho do apresentador estava internado no hospital naquela semana após um acidente, o apresentador desaba em choros. A entidade também manda sua mensagem de paz nas câmeras, joga cachaça no palco e vai embora. Todas as pessoas voltam ao normal e o Brasil passa a semana inteira comentando sobre o que acabaram de assistir.”


“No dia 1º de setembro de 1971, o tabloide paulistano Notícias Populares, publicou uma matéria onde atribuía à apresentação da ialorixá a morte do jovem Everaldo Ferreira da Silva, de 31 anos, que acabou por cometer suicídio no dia 29 de agosto, às 13h30, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio.[2] Apesar disso, ficou constatado que o jovem não estava assistindo ao programa do Chacrinha, visto que faleceu a tarde, horário em que o Programa Silvio Santos estava no ar pela Rede Globo Tampouco teria assistido ao Programa Flávio Cavalcanti, que era exibido mais tarde que o programa de Chacrinha. No horário em que os programas de Chacrinha e Cavalcanti eram exibidos, o corpo do jovem já estava no Cemitério Municipal de São Gonçalo aguardando a necrópsia. Mesmo assim, a médium foi responsabilizada pelo falecimento do jovem”


Ataques da CNBB e de alas da Umbanda

“Na sexta-feira, dia 3 de setembro, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) fez seu pronunciamento através de seu secretário-geral, o bispo Dom Ivo Lorscheiter, que declarou à imprensa que Mãe Cacilda e sua entidade “Seu Sete” haviam prejudicado a imagem do Brasil no exterior.”

“Outras críticas foram feitas pelo cardeal Dom Eugênio Sales em seu programa radiofônico, A Voz do Pastor, alertando os ouvintes sobre o “perigo das sub-religiões”.Vários periódicos católicos publicaram artigos contra a presença da Umbanda da televisão, coisa que não havia acontecido antes.” 

“A polêmica chegou ao seu ápice quando Manoel Queiroga, então presidente da União Brasileira de Estudos e Preservação dos Cultos Africanos, fora convidado para participar do Programa Silvio Santos, na Rede Globo.[6] Na ocasião, representando a entidade, se posicionou contra a Mãe Cacilda dizendo que as religiões afro-brasileiras estariam sendo conspiradas por mistificadores que encontram na fé e na desgraça dos outros uma forma de enriquecerem rapidamente. Os devotos de Seu Sete entenderam o pronunciamento como uma indireta à mãe-de-santo passando a atacar Queiroga em suas sessões.” 


Censura federal

“Por conta de toda a polêmica ocasionada pela aparição da médium nos programas de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, e Flávio Cavalcanti, bem como no pronunciamento do presidente da entidade umbandista no programa de Silvio Santos, a Censura Federal determinou a suspensão, por oito dias, dos programas de Chacrinha e Flávio Cavalcanti. Walter Clark, diretor-geral da Globo, e Almeida Castro, diretor-artístico da Tupi, se reuniram em 2 de setembro temendo proibições piores.[2] O resultado desse encontro foi a assinatura de um protocolo destinado a eliminar as atrações “de mal gosto” das grades de ambas as emissoras.”

  

Últimos anos e morte


“Mãe Cacilda trabalhou publicamente com a entidade Seu Sete da Lira até o ano de 2002, quando encerrou as suas atividades. Com o passar dos anos e o avançar da idade, Mãe Cacilda restringiu as consultas mediúnicas apenas aos seus familiares. Mãe Cacilda faleceu no dia 21 de abril de 2009, aos 92 anos, de causas naturais.” 


2 Comments

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Sueli Silva
Sueli Silva
Mar 16, 2024
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Obrigada por trazer tanta cultura e ensinamentos nas suas pesquisas. Mostrar que a nossa Umbanda existe, e resiste desde sempre aos preconceitos e difamações, que é Sagrada e traz, sim, Felicidade!

A esse grande Exu, que tanto bem fez (e faz) nosso agradecimento. Laroyê!!!!

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Laiana Dias
Laiana Dias
Mar 15, 2024

Um dia eu li sobre sobre Exu da Lira , mas não sabia a história toda …. Tantas coisas que não fazia ideia …. Viva a umbanda !

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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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