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QUIABO: A QUIZILA DE OGUM

Foto do escritor: Luiz de MirandaLuiz de Miranda
Filhos de Santo em oração

Faz parte dos fundamentos das religiões afro-brasileiras alguns interditos impostos aos seus seguidores, tanto na Umbanda como no Candomblé. Interditos são proibições que partem desde a alimentação, até cores de roupa; baseados, claro, nos estudos de seus odus (caminhos, destinos, signos); na intenção de garantir proteção e prosperidade aos seus seguidores. Tal comportamento é muito mais evidente no Candomblé; pois na Umbanda, só algumas Casas mais ligadas a mitologia dos Orixás, aplicam essa prática.

       Essas proibições são chamadas de quizilas, aquilo que traz desordem, prejuízos, confusões e atritos. Para evitar a quizila é necessário se afastar de tudo aquilo que o Orixá não gosta, não come e não veste. É uma forma de proteger os filhos contra as coisas que podem lhes fazer mal. Aqui, por exemplo, vamos falar de uma das quizilas de Ogum: o quiabo.

 

“Você sabe porque Ogum não gosta de quiabo? Foi por causa de uma contenda dele com Xangô.  Xangô era muito ambicioso por status, principalmente pelo título de rei, por se sentar no trono de um reinado. Foi o que aconteceu com a cidade de Oyó. Xangô estava para entrar em Oyó, com a sua comitiva, quando avisaram Ogum. O povo pediu a sua ajuda pois ele era um grande guerreiro, e Ogum não se negou.Mas, como em tudo existe falsidade, a notícia de que Ogum estava contra Xangô vazou. Xangô, sabendo, tomou as suas atitudes. Ele tramou uma cilada para Ogum. Mandou comprar muito quiabo em todas as aldeias e mandou picar. Fez uma pasta com o quiabo. Pelo lado em que ele ia atacar a cidade tinha uma ladeira. O que ele fez? Mandou espalhar que o ataque era naquele dia. Aí mandou espalhar o quiabo ladeira abaixo. Já viu como ficou né? Ninguém se segurava. Escorregavam todos ladeira abaixo. Foi assim que, quando Ogum apareceu no caminho, pensando que ia vencer Xangô, todos os seus cavaleiros, até mesmo ele, desceram ladeira abaixo e os seus cavalos quebravam as pernas. Assim Xangô tomou posse da cidade de Oyó e a comandou por todo um século.” ( lenda extraída do Livro Caroço de dendê, de Mãe Beata de Yemonjá)

 

Em respeito a este itan (lenda, história), o filho de Ogum deve evitar o quiabo, que pode lhe trazer desânimo, baixa auto-estima, sentimento de perda, melancolia, insegurança e outros sentimentos negativos. Afinal, essa é uma das poucas batalhas que Ogum perdeu, e sempre pra Xangô. Não à toa, são irmãos que vivem sempre brigando. E quando brigam, é para deixar claro os limites impostos tanto a um, quanto ao outro.

Aqui neste Itan, vê-se Ogum atendendo a um pedido do povo, e não se preocupa em investigar o porquê, de fato, Xangô está indo para tomar o trono, que aliás, era seu de direito. Já Xangô, se deixa levar por fofocas e falsidades, não se permitindo a ter uma conversa com o irmão Ogum.

Conclui-se então, que devemos sempre buscar a diplomacia, o diálogo, a verdade dos fatos, antes de tomarmos atitudes mais drásticas.

Ogum e Xangô estarão sempre a nos trazer os ensinamentos que precisamos para o equilíbrio de nossas emoções e sentimentos, como também reconhecermos nossos limites físicos e emocionais.

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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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