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PONTOS RISCADOS

Foto do escritor: Luiz de MirandaLuiz de Miranda

A Umbanda é uma religião que tem nos símbolos, elementos fundamentais para a realização de seus trabalhos. Tudo na Umbanda tem um porquê, uma explicação, uma razão de ser, e essa razão de ser, é facilitar ou até mesmo provocar a ligação de seus médiuns com o plano espiritual.

Cada Entidade tem sua particularidade, sua individualidade, sua assinatura; e isso se manifesta não só no seu comportamento enquanto incorporada, mas como também através de seus pontos riscados.

Existem desde sempre livros contendo inúmeros pontos riscados, que são atribuídos a essa ou aquela Entidade, o que nós, dentro da doutrina da nossa Casa, não concordamos. Nesses livros, por exemplo, vamos ver um determinado ponto riscado ao Caboclo Aymoré, dando a entender que todos os Caboclos Aymoré, devem seguir àquela ‘grafia’, o que não se encaixa dentro do nosso aprendizado, onde sabemos que um Caboclo Aymoré incorporado em um médium irá usar um determinado ponto riscado diferente do Caboclo Aymoré em outro médium. Isso se dá, por sabermos que não existe apenas um Cabocolo Aymoré, e sim, uma falange, e dentro dessa falange cada Entidade terá sua própria “assinatura”, que o fará ser reconhecido pela Mesa Dirigente da Casa e onde ela (a Entidade) firmará seu axé na Gira que está sendo realizada.

O ponto riscado é um elo poderoso de ligação entre o trabalho que está sendo realizado e a invocação das forças espirituais para que esse trabalho alcance seu objetivo. Neste caso, se enquadram os pontos de descarrego, limpeza, firmeza e corte de demandas.

Já os pontos riscados de identificação, são usados pelas Entidades para que seu axé seja materializado e sua identidade seja reconhecida e confirmada. Neste caso, os médiuns podem inclusive copiar o ponto e usá-lo para quando quiserem entrar numa sintonia mais intensa com sua Entidade.

Para uma Entidade conseguir riscar o seu ponto requer tempo e um bom desenvolvimento da mediunidade. É algo que acontece naturalmente, onde o médium não deve ficar ansioso ou na obrigação em ter que cumprir essa etapa. Há médiuns inclusive, que apesar de anos de desenvolvimento, suas Entidades ainda não realizaram esse ritual. O que não quer dizer que esse médium não está suficientemente desenvolvido ou não tenha a devida firmeza para tal. É simplesmente a Entidade aguardando o tempo certo, para que possa riscar seu ponto sem nenhuma interferência. Interferência que se dá, por vezes, pela insegurança ou desconhecimento dos símbolos da Umbanda, pelo médium incorporado.

Lembramos aqui, que além dos símbolos já conhecidos, também existem ‘riscos’ indecifráveis aos nossos olhos e entendimentos, onde as Entidades então, garantem a segurança plena do seu ponto riscado.

Para que as Entidades possam riscar o seu ponto, é utilizada a Pemba, um elemento considerado sagrado por nós Umbandistas. A pemba é um giz de forma arredondada, confeccionada calcário, banha de ori, ervas e sementes ( cada uma de acordo com a vibração de um Orixá).

Vamos então conhecer o significado de alguns símbolos usados por nossas Entidades quando riscam seus pontos.


Círculo: o todo, o universo. Quando usado em volta de todo o ponto riscado, significa que a Entidade está limitando a energia a um determinado espaço de tempo, pedindo que o ponto só seja apagado depois de alguns dias.

Flecha: símbolo dos Caboclos.

Seta: quando apontada pra cima, busca do axé. Quando apontada pra baixo, busca do equilíbrio.

Espiral: quando para fora, retirando demandas. Quando para dentro, chamando energias positivas, autoconhecimento , trazendo clareza. Símbolo associado a Iansã, Boiadeiro e Exu.

Estrela de seis pontas: equilíbrio entre o material e espiritual. Sabedoria.

Estrela de cinco pontas (Estrela de Davi): a busca pela evolução. Estrela guia. Muitas vezes associada aos Pretos Velhos.

Triângulo: fé, amor e caridade. Equilíbrio pleno entre as forças espirituais e materiais. Conquista.

Espada: defesa, ordem, disciplina, corte de demandas. Associada a Ogum.

Alfange ou sabre: símbolo associado a Iansã.

Cruz com pedestal: vitória sobre a morte. Cura de doenças. Símbolo associado a Omulu/Obaluaiê.

Cruz comum: vitória sobre a morte. Espiritualidade, tenacidade, capacidade de resistir. Símbolo associado a Oxalá.

Tridente (arredondado): princípio feminino. A busca pelo equilíbrio: corpo, alma e espírito. Associado as Pombas Giras. Ainda, à sexualidade, fecundação e criação.

Tridente (retos): princípio masculino. Mesma definição do arredondado. Associado aos Exus. Também representando a virilidade, a força e conquistas.

Coração com uma cruz dentro: a esperança, a calma, a fé inabalável. Símbolo associado a Nanã Buruquê.

Machado de duas lâminas (oxé): a justiça, o equilíbrio. Símbolo associado a Xangô.

Coração com ondas na vertical: a busca pelo equilíbrio no amor e nas conquistas. Símbolo associado a Oxum.

Folhas de palmeiras: a busca pela cura e pela espiritualidade. Proteção e segurança.

Jogo da velha: busca pela vitória. Usado para livrar-se de perturbações espirituais e materiais.

Estrela cadente com ondas: bênçãos para uma nova vida. Proteção de Mãe Iemanjá.


Ressaltamos aqui, que essas explicações podem variar de acordo com cada Entidade e a que elas estão se dispondo a realizar. Não havendo portanto, uma verdade absoluta. Até porque, na Umbanda, só há uma verdade absoluta: "a manifestação do Espírito para a prática da caridade."

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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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