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IEMANJÁ: A DEUSA AFRICANA QUE CONQUISTOU O BRASIL

Foto do escritor: Luiz de MirandaLuiz de Miranda

Atualizado: 6 de dez. de 2023

Iemanjá no fundo do mar


Na Nigéria Yemojá, em Cuba Yemayá, no Brasil Dona Janaína, Dandalunda, Inaé, Rainha do Mar, Mãe Sereia, Iemanjá. Em todos os cantos do mundo a Mãe dos Orixás, a Senhora de todas as cabeças. Seu culto foi trazido nos navios negreiros no fim do século XVIII por negros capturados em sua terra natal para serem escravizados no Brasil. Nessa dolorosa e desumana travessia pelo oceano atlântico, é sabido que muitos desses negros não suportaram os maus tratos e morreram. Seus corpos eram atirados ao mar, daí a escritora Kiussam Oliveira, pedagoga, doutora em educação, mestre em psicologia pela Universidade de São Paulo (USP) afirma que o mar, em sua visão afroreferenciada, é um território que Iemanjá colheu esses corpos: “A gente olha e vê o mar como algo maravilhoso, incrivelmente gigante, majestoso, e até violento. Mas a gente não consegue ver o mar como um tumbeiro, como tumba, como um cemitério. E a gente não pode esquecer disso. Yemanjá e os orixás chegam ao Brasil exatamente a partir de 1600, quando o tráfico negreiro começou. O sequestro de negros e negras vindos do continente africano, a travessia do Atlântico até chegar ao Brasil. Os orixás chegaram ao Brasil através de negros e negras escravizados, sequestrados do continente africano”, aponta.

O pesquisador Nelson Varón Cadena escreve sobre a data escolhida para homenagear Iemanjá: “A data 2 de fevereiro é uma das duas datas mais importantes da igreja católica no mundo ocidental. É a data de purificação de Nossa Senhora, tanto que se celebra a Nossa Senhora da Purificação, a data da Nossa Senhora das Candeias, Nossa Senhora da Luz, Nossa Senhora da Piedade, Nossa Senhora do Rosário. Inicialmente, o culto a Iemanjá na Bahia era sincretizado com Nossa Senhora das Candeias. Existe, sim, o sincretismo. O 2 de fevereiro não é uma data aleatória", considera.

Desde então, dia 02 de fevereiro se transformou num grande encontro dos seguidores das religiões de matrizes africanas, em quase todo litoral brasileiro.

Para uns, Ela é branca, cabelos pretos e longos; outros, a veneram como a mulher negra de seios fartos; e ainda, como metade mulher e metade peixe. Todas as formas são permitidas, desde que se mantenha a essência Daquela que representa a Mãe de todos os Orixás, e, portanto, a Mãe de todas as cabeças. O fato de ser branca está associado ao sincretismo que até hoje perdura; quando negra, a grande expressão da luta e da força desse povo e sua ancestralidade, e principalmente, sua origem: a África.

“... quem ouvir o canto de Iemanjá, vai com ela pro fundo do mar.” Qual Umbandista já não ouviu essa cantiga, e se questiona sobre seu significado? Não é à toa que o mar, ao mesmo tempo que fascina, também causa medo. Afinal, quais segredos e mistérios ainda existem para serem explorados quando se trata do grande reino de Iemanjá? Fascinados por sua beleza e grandiosidade, muitos se deixam levar pelo som que vem de suas ondas, que os levam a refletir sobre seus sentimentos mais íntimos, e por vezes perturbadores. Muitos são os que choram à beira mar. Aí está o sentido da cantiga! Quando mergulham na intimidade do seu próprio eu, estão sendo levados por Iemanjá a conhecerem sua própria essência, a explorar suas emoções, sensações, defeitos e virtudes. Todos são filhos do mar, o mar está em todos, e por isso, o mar é sempre um lugar de aconchego, desprendimento, lazer, meditação e contemplação. Não há quem fique indiferente diante do mar.


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SUA FÉ É RESPEITADA?

          No ano de 1990, meses antes de perder sua irmã de 29 anos de idade para um adenocarcinoma no mediastino, o Pai no Santo passa por uma experiência extremamente desagradável e revoltante, que bem retrata o racismo religioso no Brasil. Isso aconteceu no Iaserj, um hospital para os servidores do Estado do Rio de Janeiro. Era por volta das dezesseis horas. Enquanto acompanhante da irmã, ele decide ir tomar café num bar próximo ao hospital e retorna vinte minutos depois. Tempo que foi suficiente para um pastor entrar no quarto e oferecer uma oração. Voltando então do seu café, ele encontra a irmã que já vinha extremamente debilitada por conta da doença, agora, com semblante ainda mais triste e constrangido. Ele então procura levar palavras de consolo e ânimo, ao que ela responde: “_ Meu irmão, por favor, não quero que esse tipo de religioso venha fazer oração pra mim.” Ele de imediato, pergunta:  “_ O que houve?” Ela então relata o ocorrido: “_ Quando você saiu para tomar seu café, um homem de terno se apresentou como pastor da igreja universal e me perguntou se podia fazer uma oração pra mim, Como ele parecia ser uma boa pessoa e foi muito educado, eu disse que sim. Ele fez a oração, pediu pela minha saúde, e em seguida me perguntou se eu aceitava Jesus Cristo como salvador, e eu respondi que sim. Ele então disse que a partir daquele momento eu estava curada. Só que ele então perguntou qual era minha religião, o que eu respondi, que era espírita. Então ele me disse que eu teria que renegar minha religião. Eu disse que não, jamais iria renegar minha fé. Daí ele falou que infelizmente o câncer voltaria e me levaria pros braços da morte. Eu disse a ele que preferia morrer, a ter que conviver com cristãos como ele. Não quero irmão, não quero esse tipo de gente fazendo oração pra mim.”

            Em outra ocasião, anos depois, o racismo e a intolerância religiosa voltam a atacar o Pai no Santo. Dessa vez, no Hospital Regional Darci Vargas, em Rio Bonito. Indo visitar um Filho de Santo na Unidade Intensiva, o Pai no Santo se depara com uma senhora que estava ao lado do leito de seu filho perguntando se podia fazer uma oração. Como o doente estava sob efeito de fortes medicamentos, não tinha condições de responder; o que fez com que a mulher iniciasse a sua oração. Em voz alta e de tom feroz, ela dizia: “ _ Em nome do Senhor Jesus eu expulso os demônios de Pombagira, Exu, Ogum e todos os demônios dos tambores, das encruzilhadas... .” quando então foi interrompida pelo Pai de Santo; gerando na mulher um comportamento agressivo e ameaçador. Dizia ela, agora em tom mais elevado de voz: “_ Você não pode querer calar a voz de uma ministra de Deus. Seus demônios serão jogados por terra... .” quando então o Pai no Santo pediu ao funcionário responsável pela vigilância da Unidade, que retirasse a mulher do ambiente. No que foi prontamente atendido.

            Esses são dois exemplos dos milhares de outros que acontecem todos os dias, atingindo seguidores das religiões de matriz afro-brasileira. E não é à toa, afinal, não faltam umbandistas que se silenciam diante de tais fatos, e como se não bastasse o silêncio, ainda permitem que seguidores de outras religiões lhes imponham sua fé como sendo superior as demais.

            O Umbandista de fato, sabe sua origem, conhece seus Santos, suas rezas, seus cantos e louvores. Não é de hoje que a Umbanda se livrou do peso do sincretismo, dos santos que nunca foram seus, dos ritos e rituais que nunca lhes pertenceram. O Umbandista de fato, sabe a quem recorrer nas horas de aflição e desespero, e não precisa que outro religioso venha em seu socorro para rezar ou orar. Sim, não precisa! Sabe por quê? Porque o Umbandista sabe que aquela pessoa não está oferecendo uma oração para aliviar teu sofrimento. De forma dissimulada, ela quer que o Umbandista negue sua religiosidade, abandone seus Guias e Orixás. Como pode uma pessoa que frequentemente está na igreja ouvindo e dando glórias a voz de um padre ou pastor, e que não mede palavras para demonizar a Umbanda, orar por quem é Umbandista? De que vale uma oração que sai da mesma boca que chama nossos Santos de demônios?

            O Umbandista de fato, sabe o poder de seus Santos, o sangue que derramaram, o suor sofrido e causticante ardendo na pele preta, o fogo impiedoso das fogueiras da inquisição, a lâmina cortante e afiada das guilhotinas. O Umbandista de fato, sabe que seus ancestrais e antepassados morreram para garantir a liberdade aos seus  descendentes. Trazidos à força e amontoados nos navios negreiros, chegam ao Brasil e são obrigados a se batizarem do lado de fora das Igrejas, porque de acordo com as interpretações bíblicas, o preto era um ser sem alma, amaldiçoado...

            Quando um Umbandista respeita outras manifestações religiosas, não quer dizer que ele tenha que se subjugar. Os Santos da Umbanda também têm suas histórias, sua cultura, suas bênçãos e seus poderes.

            Seu Orixá está vivo e pulsante em você. Não deixe que o matem!

                                                                                                   (Luiz de Miranda-Pai no Santo)

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